No Brasil, os 42 bilionários do
país aumentaram suas fortunas em US$ 34 bilhões, do início da crise sanitária
até junho.
Segundo dados do
relatório “Quem Paga a Conta? – Taxar a Riqueza para Enfrentar a Crise da Covid
na América Latina e Caribe
”, divulgado nesta segunda-feira (27), 73 bilionários
da América Latina e do Caribe aumentaram suas fortunas em US$ 48,2 bilhões entre
o mês de março, quando a pandemia de coronavírus começou a se disseminar pelo
subcontinente, e junho deste ano.
De
acordo com a entidade, baseada em dados da Forbes, o valor é equivalente a um
terço do total de recursos previstos em pacotes de estímulos econômicos
adotados por todos os países da região. No Brasil, os 42 bilionários do país
aumentaram suas fortunas em US$ 34 bilhões no mesmo período. O patrimônio
líquido desses super ricos cresceu de US$ 123,1 bilhões, em março, para R$
157,1 bilhões em julho.
Enquanto
oito novos bilionários surgiram na região no período, a partir do início do
distanciamento social implementado por governos contra a Covid-19 (doença
causada pelo novo coronavírus), estima-se que 40 milhões perderão seus empregos
e 52 milhões de pessoas entrarão na faixa de pobreza na América Latina e Caribe
em 2020.“A Covid-19 não é igual para
todos. Enquanto a maioria da população se arrisca a ser contaminada para não
perder emprego ou para comprar o alimento da sua família no dia seguinte, os
bilionários não têm com o que se preocupar”, diz Katia Maia, diretora executiva
da Oxfam Brasil. “Eles estão em outro mundo, o dos privilégios e das fortunas
que seguem crescendo em meio à, talvez, maior crise econômica, social e de saúde do planeta no último
século”, acrescenta.
Segundo o relatório da
Oxfam, citando a Organização Mundial de Saúde (OMS), desde 1º de junho, a
região passou a ser o novo epicentro da crise sanitária da Covid-19, superando
o índice de infecção dos Estados Unidos e da Europa, “com um devastador efeito
social”.
“Os
elevados níveis de desigualdade e pobreza, preexistentes à crise, somados à
alta informalidade e a administrações públicas com recursos insuficientes, são
um efeito multiplicador que explica a vulnerabilidade da região e limita sua
capacidade de conter a pandemia”, registra a Oxfam.
Brasil
O relatório da Oxfam destaca que o Brasil se transformou no vice-líder do mundo
em número de pessoas contaminadas e mortas pelo novo coronavírus, oficialmente
denominado Sars-Cov-2, causador da doença ou infecção covid-19.
Até
a tarde desta sexta-feira, o Brasil contabilizava 2.303.661 casos da infecção,
com 84.440 mortos. “Esses números ainda parecem estar amplamente subestimados,
já que a subnotificação de casos é reconhecida até mesmo pelas autoridades
públicas. O Brasil testa sete vezes menos (por milhão de habitantes) que os
Estados Unidos, país que encabeça o ranking de infectados, e 3,5 vezes menos
que o Peru, segundo país latino-americano em casos”, diz a Oxfam.
A
trajetória do vírus, continua o relatório, “é uma fotografia das profundas
desigualdades do país”. O Brasil tinha 40 milhões de trabalhadores informais e
11,9 milhões de desempregados antes da pandemia, “muitos sem proteção social”.
Após a pandemia, horizonte que ainda nem mesmo a ciência consegue apontar com
clareza, o quadro deve se agravar muito.
“As
expectativas apontam que o desemprego pós-pandemia pode aumentar para taxas de
15%, com 16 milhões de desempregados.” Isso num país no qual cerca de 5 milhões
de moradias estão em favelas, a maioria das quais sem acesso a água tratada e
saneamento básico.
O
“racismo estrutural do país”, segundo o relatório da Oxfam, também é fator
relevante quando se analisa a pandemia, já que 75% dos mais pobres no país são
pessoas negras. “Não surpreende que os números mostrem que as pessoas negras e
pobres correspondam ao perfil de vítima mais comum da Covid-19 no Brasil,
representando 6 de cada 10 mortes.”
Propostas
A
Oxfam considera que tanto a reação do governo Jair Bolsonaro quanto a do
Congresso Nacional na atual conjuntura deixam a desejar. “Entre a pífia
proposta apresentada pelo governo federal e os discursos de lideranças do
Congresso, que defendem uma reforma tributária voltada para a simplificação e a
melhoria do ambiente para investimento, a maioria da população é escanteada
mais uma vez”, critica.
Segundo
a entidade, “ninguém parece ter a intenção de tocar nos privilégios dos mais
ricos, que nunca pagaram uma parte justa de impostos”, afirma Katia Maia. No
relatório, a Oxfam faz algumas propostas fiscais, emergenciais ou de temas
pendentes ainda não resolvidos, “para que possamos distribuir melhor a conta da
crise econômica”.
Entre
elas, um imposto extraordinário sobre grandes fortunas, resgates públicos a
grandes empresas com condições, redução de impostos para pessoas em situação de
pobreza, imposto sobre resultados extraordinários de grandes corporações,
imposto digital, deter a enorme perda de arrecadação por conta da evasão fiscal
e elevar ou criar taxas sobre rendimentos de capital.
A
reforma tributária no Brasil precisa ser profunda e estrutural, aponta a Oxfam.
“No Brasil, a discussão da reforma tributária não tem levado em conta a
necessidade de se reestruturar o sistema para torná-lo mais progressivo e
indutor da redução das desigualdades, conforme prevê a Constituição
brasileira.”
Empresas:
privilégios e dificuldades
A
desproporção entre quem perde e quem ganha também é sintomática na região da
América Latina e Caribe, diz o relatório. Enquanto as micros, pequenas e médias
empresas fecham as portas, os ganhos de grandes corporações cresceram entre 30%
e 50% desde o início do ano, segundo a entidade.
“Um
recorde, compartilhado por um punhado de grandes empresas que estão vendo como
seus resultados dispararam como consequência da pandemia, resultados tão
extraordinários como inesperados, atribuível ao efeito dos isolamentos”,
destaca.
Enquanto
isso, o cenário no Brasil, para as micro e pequenas empresas, que representam
52% dos empregos formais no setor privado, o impacto da Covid-19 atingiu “em
cheio esse setor”: 600 mil empresas já fecharam, mergulhadas em enormes
dificuldades para ter acesso aos recursos anunciados pelo governo federal sob a
forma de empréstimos.